Busca:

  Notícia
 
Luiz Duplat no Colunistas: A distância entre o discurso e a realidade


Luiz Duplat é médico obstetra, especialista em Saúde da Família e ex-secretário de saúde de Camaçari

A Ilusão do "Salvador da Pátria" na saúde de Camaçari. Entre o palanque e a realidade


Na semana passada, Camaçari sextou com a publicação de um artigo no Portal Camaçari Agora, na secção Colunistas, que foi reproduzido por outros sites do município e em grupos de WhatsApp, voltados para a política de Camaçari, que, na sua introdução, parecia uma análise séria sobre saúde pública do município, entretanto, bastou a leitura de alguns parágrafos para perceber que se tratava de algo bem diferente.


Era um exercício de autoelogio embalado como reflexão, com direito a roteiro pronto de herói contra vilões, induzindo o leitor a acreditar que o autor, com sua experiência, poderia transformar Camaçari na “melhor saúde da Bahia” — tudo isso sem o incômodo de apresentar um único dado concreto.


Como ex-gestor no período que o articulista batizou de “fundo do poço” (2017–2024), considerei não apenas pertinente, mas irresistível — e, confesso, até divertido — responder. Afinal, se ele tem o direito de escrever sua narrativa, também posso desmontá-la com fatos, ironia e uma boa dose de realidade.


O texto “Os tempos sombrios na saúde estão ficando para trás!” começa com uma exclamação otimista, mas, ao examinar sua construção, o que se lê são elementos de autopromoção e propaganda política, mais do que de análise técnica da saúde pública.


Em vez de falar de saúde pública, fala, sobretudo, do próprio autor — um desfile de credenciais, cargos e tapinhas nas costas recebidos. Se fosse currículo, estaria impecável; como análise séria de saúde, fica devendo. Como diria o personagem Coringa: “Esperava mais de você Batman”.


Entre um “talvez” modesto e um “posso afirmar com propriedade” confiante, o texto nos leva por uma viagem no tempo: em que pacientes com câncer eram enviados para casa para aguardar a morte, até ao presente, onde a tecnologia salva vidas, mas custa caro. Até aí, nada contra.


Mas o salto narrativo seguinte é digno de muito espanto: sem apresentar um único dado concreto dos indicadores do Ministério da Saúde, do tempo de espera para realização de consultas, exames e procedimentos, do número de cirurgias eletivas realizadas e do quantitativo de medicamentos e benefícios entregues a população, assim como, dos dados da vigilância à saúde, torna frágil o argumento que entre 2017 e 2024 a saúde de Camaçari bateu no “fundo do poço”. 


Saúde Pública não se faz com opiniões pessoais e sim através de análise dos dados em saúde e pesquisa de satisfação dos usuários, que inclusive nos dias atuais pode ser realizada através das redes sociais, e que mostram que o governo atual, não possui pontuação positiva, haja vista a quantidade de postagens negativas sobre retorno das filas nas madrugadas para marcação de consultas e exames, assim como a ausência de realização de cirurgias eletivas, a não concessão de benefícios previstos pelo SUS – Sistema Único de Saúde (cadeira de rodas, cesta básica, transporte sanitário, etc.). 


A até mesmo da falta de medicamentos de responsabilidade do município, claro que não poderia deixar de falar dos pedidos de socorro de parentes e amigos de pessoas que estão na “Fila da Morte”, isto é, na regulação das urgências, que terminam falecendo nas UPAS e PAs de Camaçari, aguardando uma vaga nos hospitais.


É curioso: para um texto escrito por quem se apresenta como autoridade e especialista em saúde pública, faltar números, indicadores, pesquisas. No lugar deles, aparece um vilão — a gestão anterior — e um herói — o governo atual, capaz de “virar a chave” e transformar Camaçari na “melhor saúde da Bahia”. 


É o típico roteiro de filme canastrão, onde os problemas se resolvem com a chegada do mocinho (e neste caso em tela, convenhamos, nem tão mocinho). Pena que o SUS não seja um filme de ação, e sim um drama coletivo que exige dos gestores um trabalho sério, com planejamento e continuidade do existente, para ser enfrentado.


Ao evitar causas estruturais, como, o subfinanciamento crônico do SUS, a formação dos profissionais, a ausência de articulação entre a atenção básica e a especializada, a dificuldade da regulação das urgências e emergências, principalmente na Bahia, e o clientelismo político existente em Camaçari, o texto cria a ilusão de que tudo se resume a quem se senta na cadeira de secretário ou prefeito. É a velha fantasia do “salvador da pátria”. 


Ao centrar a narrativa em governos e nomes, perde-se a oportunidade de discutir o que realmente sustentaria avanços duradouros na saúde de Camaçari.


Concluindo, o texto não é sobre a saúde de Camaçari, mas, sobre a vaidade e veladas pretensões de quem o escreveu. Pode ser um bom material para palanque eleitoral, mas como contribuição para o debate público sobre a saúde de Camaçari, é imprestável.


Luiz Duplat duplat.luiz@hotmail.com é médico obstetra, especialista em saúde da família e ex-secretário de saúde de Camaçari


Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade do autor

12/agosto/2025

Mais Notícias

José Américo da Matta no Colunistas: A simbiose máquina/homem
Ministério Público aciona a Cetrel e a Paranapanema por poluição de rio em Camaçari
Luiz Carlos Azedo no Colunistas: O papel do Congresso e Trump
Brasil perdeu 11 milhões de hectares de áreas naturais em 40 anos
Curso prepara mulheres empreendedoras em Camaçari
Conta de energia deve fechar ano com reajuste acima da inflação
Luiz Duplat no Colunistas: A distância entre o discurso e a realidade
Coluna Camaçarico 11 de agosto 2025
Bahia ganha mais uma fábriba de eletroeletrônicos
Waldeck Ornélas no Colunistas: O Cimatec e o voo da inovação


inicio   |   quem somos   |   gente   |   cordel   |   política e políticos   |   entrevista   |   eventos & agenda cultural   |   colunistas   |   fale conosco

©2025 Todos Direitos Reservados - Camaçari Agora - Desenvolvimento: EL