Mais do Mesmo: A crise moral na substituição de Lupi e o custo político para Lula e a esquerda
A demissão de Carlos Lupi da presidência do INSS, em meio ao escândalo bilionário revelado pela Polícia Federal, oferecia ao presidente Lula uma rara oportunidade de sinalizar ao país que ainda comanda o governo com autoridade moral e compromisso com a justiça social. No entanto, ao invés de escolher um técnico independente, capaz de resgatar a credibilidade da Previdência Social, Lula preferiu seguir o roteiro de sempre: substituiu seis por meia dúzia, mantendo a lógica de alianças fisiológicas que têm marcado sua terceira gestão.
A Previdência é um dos maiores entraves estruturais do Brasil. Trata-se de um sistema engessado, caro, injusto e cada vez mais insustentável num país que envelhece rapidamente, com um mercado de trabalho informal e uma população que começa a se dar conta de que dificilmente terá uma aposentadoria digna. Enquanto categorias privilegiadas se aposentam com pouco mais de 50 anos, milhões de brasileiros acumulam décadas de trabalho precário, sem a garantia de um amparo na velhice.
Ao optar por outro nome da mesma engrenagem partidária, Lula desperdiça a chance de fazer uma inflexão histórica, acenando não apenas ao mercado ou à oposição, mas principalmente ao povo que votou nele e ainda acredita na ideia de um governo popular. A escolha é sintomática de um presidente cada vez mais preocupado com sua sobrevivencia política e com a frágil arquitetura política que sustenta sua base no Congresso, do que com a construção de um legado de trabalho sério e justiça social.
Essa decisão é um erro estratégico — e moral. Em vez de se diferenciar do passado recente de aparelhamento e escândalos, Lula parece replicá-lo com verniz “progressista”. O discurso da esquerda perde força diante da prática que a contradiz. E pior: alimenta a reorganização da direita brasileira, que começa a ganhar corpo com a federação entre União Brasil e Progressistas, sinalizando um projeto pós-bolsonarismo, mais polido, mas com a mesma sede de poder.
Lula sabe que o tempo político está contra ele. Seu sucessor natural não existe. A esquerda, depois dele, caminha para uma crise de lideranças tão profunda que talvez apenas um movimento de ruptura — uma “revolução” cultural, ética e geracional — possa devolvê-la ao protagonismo. Enquanto isso, a direita constrói sua narrativa de moderação e retomada, explorando cada contradição do governo com apetite renovado.
A queda de Lupi poderia ter sido o marco de um novo ciclo. Mas o que se viu foi só mais um capítulo do velho enredo da governabilidade a qualquer custo — custo esse que, no fim, sempre sobra para o povo.
José Américo Moreira da Silva zamerico1961@gmail.com é jornalista, publicitário, baiano radicado em Brasília
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